

Alguns trotes violentos tiveram grande repercussão durante muitos anos. O último a estar em destaque na mídia foi em 99, quando o calouro da Faculdade de Medicina da USP, Edison Hsueh, foi encontrado morto na piscina da associação atlética dos alunos, no dia seguinte a um churrasco oferecido pelos veteranos.
Veja abaixo uma cronologia de outros casos que ficaram na história:
- Março de 1980 - O calouro da Universidade de Mogi das Cruzes Carlos Alberto de Souza morre devido a socos na cabeça em um trote. Ele reagiu quando os veteranos tentavam cortar seu cabelo à força
- Março de 1990 - O estudante de direito George Araguaia Parreira Mattos, 23, tem uma parada cardíaca e morre quando tentava fugir de trote, em Rio Verde (Goiás)
- Fevereiro de 1991 - O aluno da 8ª série da Fundação Instituto Tecnológico de Osasco Júlio César de Oliveira, 16, morre depois de receber três golpes de tesoura ao reagir a um trote.
- Abril de 1992 - O estudante de economia Alexandre Spencer Vasconcelos, 20, é expulso da Puccamp por ter praticado trote violento contra José Ricardo Ribeiro Pinto, 23, que sofreu fratura na mandíbula, amnésia e teve de passar por cirurgia
- Março de 1993 - O estudante Ugo Luís Boatttini Jr., 19, abandona a vaga no curso de engenharia que conquistou na Unesp de Guaratinguetá depois de passar por trote violento. Ele teve um peso de sete quilos preso aos seus órgãos genitais, entre outras agressões
- Março de 1998 - O estudante Rodrigo Favoretto Cañas Peccini, 19, foi internado no Hospital Regional de Sorocaba (SP) depois de ter sido queimado por companheiros da Faculdade de Medicina da PUC-SP durante um trote
- Fevereiro de 1999 - O calouro Edison Hsueh foi encontrado morto dentro da piscina da Associação Atlética Oswaldo Cruz, o clube dos alunos da Faculdade de Medicina da USP, na manhã seguinte ao churrasco de recepção dos aprovados no vestibular.
Disponível em:
Histórico das mortes
Disponível em: http://epoca.globo.com/edic/19990510/soci2.htm
Istoé
Nº 1542 – 21 de abril de 1999
LUISA ALCALDE
"Eu era funcionário da universidade, trabalhava como analista de rede e frequentava a Atlética. No dia da morte do Edison, cheguei por volta das 18 horas junto com um amigo, o Ronaldo.
Estava frio e escuro. No bar, ao lado da piscina, havia alguns alunos embriagados. Minutos depois, chegaram outros três estudantes, dois loiros e um moreno.
Nesse momento nós interviemos. Os três saíram com o garoto. Meia hora depois, o calouro retornou, em estado pior. Estava trêmulo e perguntou como chegar a uma rua vizinha, mas não entendeu a explicação.
Demos café para o menino e o Ronaldo o levou para a pensão onde estava hospedado. No outro dia, fui correr bem cedo na Atlética e contei a alguns amigos o que havia acontecido na véspera.
Na quarta-feira, o diretor da faculdade me ligou e pediu que prestasse depoimento. Fui. Dias depois, me demitiram, alegando corte de pessoal."
Disponível em: http://www.terra.com.br/istoe/especial/154216.htm
Até hoje, um ano e três meses depois do trote fatal, ninguém foi responsabilizado. A promotora Eliana Passarelli acha que Edison sucumbiu pelas mãos do crime. Promete apresentar nomes até julho. Enquanto prevalece a impunidade, a suspeita paira sobre todos. É mais pesada para os inocentes. Assim prossegue o calvário da turma de 1999. Poderia ter sido um deles a morrer na piscina. Vitoriosos ao inscrever o nome na cobiçada lista de aprovados da Medicina da USP, nunca puderam comemorar.
Filho de um engenheiro e de uma dona-de-casa de Jundiaí, no interior paulista, Lucas quer ser médico desde que cursava o ensino médio. Amargou um ano de cursinho antes de conseguir a aprovação no vestibular da USP. Participou, como vítima, do trote que encerrou a vida de Edison. Descobriu a morte do colega, que não chegou a conhecer, durante um passeio de apresentação à USP, no dia seguinte. Desde então, convive com a tragédia. "Nós nos esforçamos para passar e, de repente, fomos tratados como assassinos. Nem a camiseta da Medicina podíamos usar", resume.
Não há comparação entre a dor que consome a família de Edison e o trauma que assombra a turma de 1999. Mas os calouros do ano que não terminou pagam um preço alto. "Queremos que tudo seja esclarecido", diz Tiago Ferreira, de 19 anos. "Para que acabe." A frase sintetiza o sentimento desses estudantes.
Disponível em: http://epoca.globo.com/especiais/2anos/educacao.htm
Em 22 de fevereiro de 1999, às 7 horas da manhã, os calouros assistiram à aula inaugural no teatro da faculdade. Após as palestras do diretor e de representantes da Associação Atlética e do Centro Acadêmico, foram avisados de que não precisariam participar do trote caso não desejassem.
Quase todos aderiram ao ritual. Depois de deixar pertences pessoais como relógios, carteiras e camisetas em sacos plásticos, os estudantes tiveram os pulsos amarrados com barbantes. Bombardeados por ovos, tinta, farinha e violeta genciana, um corante usado em pesquisas de bactérias, seguiram até o busto de Arnaldo Vieira de Carvalho, primeiro diretor e patrono da faculdade, onde cantaram hinos, fizeram reverências e beijaram o chão.
Abusos durante o trajeto foram relatados. Uma das brincadeiras impostas simulava uma partida de boliche. Um calouro, geralmente mais obeso, era a bola e os demais as garrafas. O aluno-bola era obrigado a rolar em direção aos pinos e derrubá-los. Alguns estudantes tiveram o braço engessado com o de um colega. Outros tiveram de fingir praticar sexo com uma árvore. Nas imagens das fitas de vídeo anexadas ao processo, calouros aparecem sendo chutados.
Depois das brincadeiras, os estudantes caminharam até a Associação Atlética. No bosque, foram lavados - os calouros pelas veteranas, as calouras pelos veteranos. Seguiram então até a arquibancada em frente à piscina. Enfileirados, acompanhados pelo som de uma bateria, entoaram alguns hinos. Garrafas de pinga lhes eram oferecidas - muitas vezes com insistência.
Ao ouvir gritos de ordem, caíram na água. Dois calouros relatam que, devido ao grande número de pessoas, aqueles que estavam na frente eram empurrados. Um estudante contou ter sido efetivamente jogado na água.
Ao tentar segurar na borda, apanhou com uma baqueta na cabeça. Chamado a depor novamente no ano passado, como testemunha de acusação, o aluno negou a versão. Disse não se lembrar de ter sido empurrado na piscina.